domingo, julho 02, 2006
110 Rodoviária-Leblon
Sentada sobre a mala de barbie, com puxador e rodinhas, a menina conversa animada com a coleguinha. Uniforme branco e laranja da rede pública do Rio, cabelos de molinha à altura dos ombros, presos por um laço frouxo atrás, eriçados pelo vento da janela. Deve ter seus 7 anos, talvez mais. Lábios grossos, dentes à Gaúcho, ela se enquadra no que a sociologia de Pindorama convencionou chamar mestiço, ou pardo. A luz da manhã no rosto mostra que está mais pra branca do que negra. Fiquei ali observando a luz no olhar, o sorriso aberto, as mãos dançando no ar no mesmo ritmo frenético dos casos inaudíveis que contava. E imaginando quanto tempo vai demorar para que ela se transforme na adolescente sentada três bancos atrás, 16 anos no máximo, unhas roídas brilhando numa confusão de cores berrantes, sandália de dedo com 10 cm de sola, barriga lutando com a miniblusa que defintivamente não foi cortada para vestir o bebê de 6 ou 7 meses que se forma. Olhar perdido, embaçado, talvez a gravidez tenha chegado antes dos diplomas, dos empregos e das viagens com que a cabelos de molinhas ainda sonha... Em que momento da vida será que perdemos a inocência, a espontaneidade da cabelos de molinha? Essa não-preocupação com o que não devemos nos preocupar? O que será que podemos fazer para evitar que a cabelos de molinha troque os volteios animados de mão no ar pelo olhar embaçado? O quê?
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2 comentários:
Muito bom! Como tudo que vocês escrevem!!!
Por isso é que eu fico com as crianças e os velhinhos da praça!
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