segunda-feira, maio 21, 2007

A orquestra do 17º

As flautas soavam doce, os violões e cavaquinhos solavam em conjunto macio e os tambores e bumbos marcavam presença suave ao fundo, como alguém que anda pisando nas pontas dos pés. Sentado atrás de uma mesinha acanhada, o professor regia a pequena orquestra na sala de janelas grandes do 17º andar, por onde entrava um sol tímido de inverno. Entre as estantes com as partituras da música, chinelos de dedo marcavam o ritmo do andamento. Em todos os rostos, alguns mais adolescentes, outros já mais adultos, uma luz especial denunciava a satisfação por estar ali, vivendo aquele momento, criando aqueles sons. Construindo presentes e futuros com instrumentos de sopro, corda e percussão.
Do lado de fora das grandes janelas, a realidade daqueles músicos estava bem concretizada em milhares de casinhas, casões e até prédios feitos de tijolos aparentes. Construções precárias que trepam morro acima de forma desordenada formando aquele gigante que nos acostumamos a ver pela tevê como um câncer crônico enraizado na beira da estrada Lagoa-Barra. Um problema sem dono e sem rosto, mas com nome famoso: Rocinha.
Eu nunca tinha chegado tão perto de uma favela. E embora tenha passado ao largo (eu não entrei lá, só fui do outro lado da rua, no prédio da Prefeitura, onde funciona a Escola de Música da Rocinha), senti pela primeira vez que ela tem vida, tem alma. Porque conheci naquela sala, os verdadeiros guerreiros da Rocinha, gente que luta batalhas diárias para viver com dignidade, sem fazer mal a ninguém. Guerreiros que usam seus intrumentos para dispara acordes de harmonias que alimentam a vida.

Um comentário:

Anônimo disse...

Lindo texto. Eu já fui voluntária na favela do Heliópolis. Dava aula de alfabetização para adultos. Há trabalhos excelentes nas comunidades carente. E, apesar dos pesares, há muita gente boa e trabalhadora na favela.