quarta-feira, agosto 30, 2006

A dor


Sentada na calçada fria da Cinelândia, com as pernas esticadas, ela confortava o filho morto no colo. Segurava a cabeça de um corpo todo ensangüentado com os braços em concha, exatamente como fazia quando o embalva ainda bebê. Seu rosto, no entanto, estava longe da luz radiante do afeto. O semblante carregado expressava a incompreensão, o ódio pelo mundo que acabara de matar seu filho com dois tiros pelas costas. Uma pietà trágica, sem piedade divina, apenas uma dor surda que nem Michelângelo seria capaz esculpir, jamais; iluminada por um misto de amarelo e vermelho, luzes da noite suja do centro carioca e do giroflex da viatura policial; exposta no altar da primeira página de um jornal, catedral moderna da sociedade midiática. Foi uma das cenas mais fortes e poéticas que já vi impressa, e foi captada pelo fotógrafo Marcelo Carnaval. Quem quiser conferir uma versão dela (não é exatamente a que saiu na primeira página), pode usar o link do título deste post.

3 comentários:

Marina disse...

senti o coração apertado quando vi a foto.

Anônimo disse...

É uma realidade brutal, onde o homem usurpa o direito natural de se morrer, ainda que pela mais trágica doença. Resta tão somente o consolo da liberdade para quem se foi. Bom se a reportagem com a captação fotográfica pudesse ser inserida em um contexto educacional. Enfim, acima de tudo ânimo para se crer, sustentar e lutar por dias melhores.
Parabéns Ferdi.
Beijo.

Anônimo disse...

Gente,

Estou divulgando o blog pra um monte de gente. Acho que o texto de vocês precisa alcançar muitos ouvidos!

Bjs!