sábado, fevereiro 24, 2007

Bogotá-Rio

A caminhonete preta Hillux, 4X4, foi intercepetada por um astra também preto numa rua calma do Recreio dos Bandeirantes no meio da tarde da última quinta-feira. Quatro homens desceram armados de pistolas e fuzis (FAL e AR-15, provavelmente) e despejaram 46 tiros sem pronunciar palavra. Ao volante, o inspetor Félix dos Santos Tostes, 49 anos, 18 deles dedicados à Polícia, morreu com 40 tiros.
Tostes havia sido afastado no dia 30 de janeiro, sob a acusação de chefiar a milícia que vende segurança na Favela de Rio das Pedras, em Jacarepaguá, zona Oeste da cidade.
No governo passado, ele servira no gabinete do chefe da Polícia Civil. Em setembro de 2006, inclusive, fora condecorado pelo delegado-chefe à época, Ricardo Hallak, com a medalha de Honra, Fidelidade e Devotamento da corporação. Governo novo no poder, o discurso na Secretaria de Segurança mudou. Agora é preciso combater as milícias como a que, segundo as denúncias, era chefiada por Tostes e o condecorado inspetor foi afastado.
O crime é mais uma prova da proporção que estão tomando as milícias no Rio de Janeiro. Verdadeiras organizações paramilitares, elas se propõem a fazer o papel que caberia à Polícia: acabar com o tráfico e o consumo de drogas nas comunidades pobres. Com a conivência da corporação, os grupos armados invadem as favelas e expulsam os traficantes. Depois, passam a cobrar dos moradores pela segurança que oferecem.
Os milicianos impõem-se pelo terror. Executam pessoas acusadas de colaboração com traficantes em julgamentos sumários e ameaçam pais de menores flagrados com drogas. Além da segurança, cobram taxas extras pelas instalações de TV a gato e pelo comércio de gás.
Repletas de policiais civis, militares e bombeiros, as milícias já dominam 92 favelas na cidade, segundo levantamento da subsecretaria de inteligência da Secretaria de Segurança. Garantem rendimento extra aos mesmos policiais que deveriam combatê-las. Por isso, encontram caminho livre. Quando traficantes tentam retomar as favelas, a polícia aparece para combatê-los; mas jamais tentou impedir a tomada dos morros pelos milicianos.
Milícias e empresas clandestinas fazem parte do movimento de privatização da segurança que não é novo, nem apenas um fenômeno carioca. No Rio, porém, a coisa começa a tomar forma de guerrilha. As milícias crescem e se fortalecem com a conivência do Estado; quando as autoridades decidirem combatê-las, corremos o risco de mergulhar numa guerra civil.
Foi exatamente assim com as Autodefensas Unidas de Colômbia, há exatos 40 anos. Basta olhar para a situação atual do país para entender do que eu estou falando.

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